quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Trágico

Olá,

Já não me recordava bem o que era trocar correspondência contigo, falha minha, peço perdão. Recebi inúmeros telegramas teus, é verdade, mas infelizmente tenho andado numa correria, uma azáfama que eu nem te digo. De qualquer forma o meu bem haja por toda a tua preocupação.
Falemos agora do que realmente importa. As ruas lá fora fazem lembrar uma escoada, não de lava, mas sim de sangue, para além dos milhares de corpos perdidos de si e de quem os ama. Os vivos, refiro-me a vivos sãos, andam desesperados à procura de sobreviventes deste martírio. Que calvário que desceu às nossas vidas! Ainda assim e felizmente Deus escolheu alguns de nós para sobreviverem e não terem de assistir a esta aparição diabólica. Não imaginas a carência que eu já sentia de escrever, de transpor as minhas emoções e agonias para o papel, de poder-te confessar aquilo que só a minha alma acarreta, espírito que se desfalece a cada dia, a cada hora…
Numa das tuas poucas aparições citadinas, quando te levei à praça de comércio para comprarmos um mimoso arranjo de flores, aqui mesmo na rua um pequeno rapaz embateu contra nós, não sei se te recordas? Corria apressadamente para ir brincar, com certeza. O pequeno António era uma criança com uma fugacidade fora do normal, sempre disposto a ajudar todos à sua volta. Às vezes enternecia-me a ver aquele miúdo, enquanto lia e relia vezes sem fim os processos da rádio, a subir às árvores, e também a forma como ele manejava o seu pião. Era de um autêntico às, diga-se de passagem, e, não menos importante, a fidelidade que ele tinha para com os seus comparsas de brincadeiras, sem dúvida que era de enaltecer na idade dele.
No outro dia ia a caminho da rádio quando vejo uma grande manifestação perto da Praça da Figueira, algo comum nos últimos meses, o problema é que de um momento para o outro começaram-se a ouvir passos que a cada instante que se passava tornavam mais nítidos e temerosos. Era a polícia! Ao longe nascia uma corrente de homens a correr num passo acelerado com um bastão em punho em direcção aos pobres manifestantes que lutavam por uma vida melhor. Nesse instante recordei-me dos livros de história da idade média que tinha lida há uns dias atrás. Durante uns segundos não consegui entender a diferença entre um campo de batalha do tempo dos reis e das rainhas e aquilo que estava mesmo à frente dos meus olhos e, que infelizmente, eu não podia desfolhar as páginas do terror. Apercebi-me que algo não condizia com os meus livros quando uma criança ensaboada de sangue caiu nos meus braços; tinha sido alvejado no peito e mal conseguia permanecer com aqueles olhos cor de mel abertos. Foi aí que despertei! E depois de passar a mão pela sua cara enxerguei realmente o que estava diante dos meus olhos; o António estava feriado, gravemente ferido. Escusado será dizer que o pequeno António não escapou e eu fique lavada em lágrimas.
E, é assim. Quando puderes conta-me como tens passado.


Um beijo enorme

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Dream


Vou amar-te.
Hoje, amanhã e depois de amanhã.
Com defeitos e virtudes,
com
apreços e desdéns,
em Presença ou na solidão.

Vou amar-te,
porque é o único amor que sinto.
A verdade e a plenitude,
Concretizarao para sempre,
uma eterna comunhão.

Vou amar-te.
Num dia escuro ou na noite.
Tu concebes-me o arco-íris,
a luz, o ar, a Vida
para seres dono do meu coração!